INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 49 de 2023, OMISSÃO LEGISLATIVA E GREVE DOS SERVIDORES PÚBLICOS: a manutenção de condutas antissindicais por parte do Legislativo e Executivo Federal.

No dia 22 de dezembro do último ano, o Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos publicou no Diário Oficial da União, a Instrução Normativa (IN) SRT/MGI nº 49, de 20 de dezembro de 2023, que altera a Instrução Normativa nº 54, de 2021, proferida durante o mandato de Jair Bolsonaro, que dispunha sobre direito de greve das servidoras e dos servidores públicos (Brasil, 2023). A publicação da medida ocorreu dias após o Governo Federal sinalizar que não haverá recomposição salarial para o funcionalismo federal em 2024, prevendo o reajuste salarial de 9% parcelado nos anos de 2025 e 2026.

Além de não atender à reivindicação do funcionalismo público pela revogação da Instrução Normativa nº54, a Instrução Normativa nº 49 amplia para 72 horas o período mínimo de antecedência para a notificação de paralisação, para que possa ser firmado posterior acordo de compensação de horas não trabalhadas. Anteriormente, o prazo era de 48 horas (Brasil, 2023). Ademais, a Instrução Normativa nº 49 também prevê o desconto da remuneração correspondente aos dias de paralisação devido ao exercício do direito de greve e da elaboração do respectivo Termo de Acordo para compensação de horas não trabalhadas (Brasil, 2023).

Neste contexto, é importante observar que o direito de greve possui previsão constitucional ampla, disposta no artigo 9º da Constituição da República Federativa do Brasil1, o qual foi estendido aos servidores públicos seguindo o disposto no artigo 37, VII2 do mesmo ditame legal (Brasil. 1988). Cabe evidenciar ainda, que de acordo com a previsão da CRFB/88, compete aos trabalhadores a decisão relativa à forma de exercício deste direito, bem como a formulação das pautas reivindicatórias do movimento paredista (Brasil, 1988).

Apesar da norma constitucional que dispõe sobre o exercício do direito de greve dos trabalhadores do setor privado ser uma norma de eficácia plena, a Lei 7783/89 regulamenta, desnecessariamente o exercício do direito de greve para este setor. Por sua vez, embora o artigo 37 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 se constitua enquanto uma norma de eficácia limitada até hoje não foi editada lei específica para o tema. 

Ante a esta omissão legislativa, foram impetrados diversos Mandados de Injunção perante o Supremo Tribunal Federal por categorias de servidores públicos em face da mora do Poder Legislativo. A despeito dos Mandados de Injunção impetrados e da previsão constitucional, o Poder Legislativo ainda não disciplinou o exercício do direito de greve no âmbito do funcionalismo público. Diante disso, o Supremo Tribunal Federal passou a conferir, então, concretude ao texto constitucional e determinou a aplicação subsidiária da Lei nº 7.783/1989 (Lei Geral de Greve) aos servidores públicos, enquanto inexista a regulamentação do artigo 37, VII, da Constituição Federal.

Tanto as Instruções Normativas publicadas por parte do Executivo Federal, quanto a omissão por parte do Legislativo no que diz respeito à edição de lei específica para regulamentar o exercício do direito de greve no setor público se caracterizam como “condutas antissindicais”. A antissindicalidade, ou condutas antissindicais, se caracterizam enquanto ações ou omissões hostis aos sindicalistas, aos sindicatos, à sua filosofia ou aos seus propósitos, independentemente de tratar-se de uma prática isolada ou de uma verdadeira atividade concertada. Como tal é, em última análise, palavra que consubstancia a conduta de quem obstaculiza os direitos de liberdade sindical – individuais ou coletivos; positivos ou negativos; organizacionais ou acionais – e que, mesmo sem se dar conta disso, turba, por ação reflexiva, a progressividade de outros tantos direitos (Uriarte,1989; Batista, 2014). 

Por fim, é importante observar que as condutas antissindicais materializadas nas Instruções Normativas publicadas pelo Executivo Federal, bem como nas omissões por parte do Poder Legislativo são obstáculos para o exercício do direito de greve dos trabalhadores brasileiros e contrariam o direito à liberdade sindical, previsto no artigo 8º da Constituição da República Federativa do Brasil de 19883. Do mesmo modo, a antissindalidade é  vedada pelas Convenções 87 e 98 da Organização Internacional do Trabalho, as quais o Brasil é respectivamente vinculado e signatário. 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

BATISTA, Flávio Roberto. A PROTEÇÃO CONTRA ATOS ANTISSINDICAIS À LUZ DA LIBERDADE SINDICAL: introdução a uma contextualização jurídico-política. Revista da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. v. 109, p.441-458, jan-dez 2014. São Paulo, 2014. Disponível em: <chrome-extension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/https://egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/a_protecao_contra_atos_antissindicais_a_luz_da_liberdade_sindical.pdf>  Acesso em: 29/01/2024.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da União,5 out. 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em: 29 de janeiro de 2024.

BRASIL. SUPREMO DETERMINA APLICAÇÃO DA LEI DE GREVE DOS TRABALHADORES PRIVADOS AOS SERVIDORES PÚBLICOS. Notícias STF de 25.10.2007. Disponível em: . Acesso em: 29/01/2024.

BRASIL.Instrução Normativa nº 49, 22 dez 2023. Diário Oficial da União. Disponível em: https://www.andes.org.br/diretorios/files/Bruna%20PDF/1/2/3/INSTRU%C3%87%C3%83O%20NORMATIVA%20SRT_MGI%20N%C2%BA%2049%2C%20DE%2020%20DE%20DEZEMBRO%20DE%202023%20-%20INSTRU%C3%87%C3%83O%20NORMATIVA%20SRT_MGI%20N%C2%BA%2049%2C%20DE%2020%20DE%20DEZEMBRO%20DE%202023%20-%20DOU%20-%20Imprensa%20Nacional(1).pdf. Acesso em: 29/01/2024.

OIT. Convenção 87, Liberdade Sindical e Proteção ao Direito de Sindicalização. Organização Internacional do Trabalho. Disponível em: <https://www.ilo.org/brasilia/convencoes/WCMS_239608/lang–pt/index.htm>. Acesso em: 29/01/2024.

OIT. Convenção 98, Direito de Sindicalização e Negociação Coletiva. Disponível em: <https://www.ilo.org/brasilia/convencoes/WCMS_235188/lang–pt/index.htm>. Acesso em: 29/01/2024.

URIARTE, Oscar Ermida. A proteção contra os atos anti-sindicais. São Paulo: LTr, 1989.

  1. Art. 9º É assegurado o direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender.
    § 1º A lei definirá os serviços ou atividades essenciais e disporá sobre o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade.
    § 2º Os abusos cometidos sujeitam os responsáveis às penas da lei.
    ↩︎
  2. Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:  
    VII – o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica.
    ↩︎
  3. Art. 8º É livre a associação profissional ou sindical, observado o seguinte:
    I – a lei não poderá exigir autorização do Estado para a fundação de sindicato, ressalvado o registro no órgão competente, vedadas ao Poder Público a interferência e a intervenção na organização sindical;
    II – é vedada a criação de mais de uma organização sindical, em qualquer grau, representativa de categoria profissional ou econômica, na mesma base territorial, que será definida pelos trabalhadores ou empregadores interessados, não podendo ser inferior à área de um Município;
    III – ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas;
    IV – a assembléia geral fixará a contribuição que, em se tratando de categoria profissional, será descontada em folha, para custeio do sistema confederativo da representação sindical respectiva, independentemente da contribuição prevista em lei;
    V – ninguém será obrigado a filiar-se ou a manter-se filiado a sindicato;
    VI – é obrigatória a participação dos sindicatos nas negociações coletivas de trabalho;
    VII – o aposentado filiado tem direito a votar e ser votado nas organizações sindicais;
    VIII – é vedada a dispensa do empregado sindicalizado a partir do registro da candidatura a cargo de direção ou representação sindical e, se eleito, ainda que suplente, até um ano após o final do mandato, salvo se cometer falta grave nos termos da lei.
    Parágrafo único. As disposições deste artigo aplicam-se à organização de sindicatos rurais e de colônias de pescadores, atendidas as condições que a lei estabelecer.
    ↩︎